DADOS PESSOAIS
Nome: JP
Idade: 53 anos
Profissão: Empresário.
Sexo: Masculino
Estado Civil: Casado
Agregado
Familiar: Mulher e dois filhos. Os filhos com 27 e 24 anos.
Habilitações: Licenciado
em Gestão.
Naturalidade:
Faro
MOTIVO
DA CONSULTA
O doente, José
Manuel Pinto, de 53 anos, funcionário público, é encaminhado ao psicólogo pelo
médico de família. Está a ser medicado com um ansiolítico (Alprazolam) há cerca
de quatro meses.
O doente conta
que a sua esposa diz que ele é uma pessoa muito desconfiada, pois pensa que a
esposa e os filhos aprontam contra ele quando não contam determinados
pormenores sobre qualquer coisa que pretendem fazer e perfeccionista, zanga-se
quando vê as coisas fora do lugar, tendo por vezes, discussões com a
vizinhança.
É questionado ao
doente se já foi consultado por algum psicólogo mas a resposta foi de que nunca
tinha ido ao psicólogo mas segundo o doente, sente-se absolutamente ciente de
que o processo psicoterapêutico vai ser positivo.
DIFICULDADES
ACTUAIS
A principal
dificuldade actual do doente é o facto da sua mente ser corrompida por
obsessões que invade a sua mente de forma estereotipada e pelas compulsões que
são os rituais que o doente utiliza para, de certa forma, aliviar-se das
obsessões. O doente apresenta obsessões pela desconfiança e pelo perfeccionismo.
As obsessões pela desconfiança justificam-se pelo facto do doente desconfiar
exageradamente da esposa e dos filhos, pensando que eles quando tem algum
projecto a realizar, pensa que eles aprontarão contra ele. As obsessões pelo
perfeccionismo devem-se ao facto do doente ser demasiado exigente consigo
próprio e com os outros, querendo tudo perfeito e discute com alguma
regularidade com a esposa e filhos, com os vizinhos e com os colegas de
trabalho, quando eles não são demasiado perfeitos.
O doente relata
que a relação com a sua mulher tem se deteriorado com o aparecimento das
obsessões. O doente manifesta uma profunda devoção ao trabalho e já não dá
tanta importância á relação com a mulher, porém, é exageradamente ciumento e
não admite que a sua mulher converse com outro homem.
O paciente
sempre averigua se existe em casa algum objecto que, eventualmente, seja
oferecido à sua mulher por outro homem.
No ambiente
conjugal, o doente discute quase todos os dias com a sua mulher devido à
obsessão pela traição que o corrompe.
O doente garante
que as discussões são apenas de ordem verbal e nunca aconteceu qualquer
agressão física.
O paciente tem
uma relação muito afectuosa com os filhos, porém as obsessões invadem a sua
mente e a relação torna-se caótica e insustentável.
O Sr. José
relata que num certo dia os filhos e ele combinaram para assistirem um jogo de
futebol mas ocorreu um imprevisto que os impossibilitou de irem ver o jogo,
então o doente relata que pensou que os filhos combinaram entre si para cancelar
a ida ao futebol só para não estarem ao lado do pai.
José não tem
discussões habituais com os filhos, porém quando as obsessões invadem a sua
mente, ele descarrega sobre os filhos uma carga negativa e procura nas coisas
dos filhos qualquer coisa que ele julgue ser usada pelos filhos contra si.
O paciente,
sempre que discute com os filhos e com a sua esposa tem compulsões como arrumar
as gavetas 7 vezes, arrumar o seu roupeiro 7 vezes, contar 7 vezes todas as
suas coisas.
No início do
dia, o doente veste-se 7 vezes porque a obsessão diz-lhe que se ele se vestir 7
vezes, os seus filhos e a sua esposa não aprontarão contra si.
Em relação à
obsessão pela ordem e perfeição, o doente já teve algumas discussões motivadas
por essas obsessões com a esposa e filhos, quando estes não deixaram a casa
demasiado limpa e arrumada. O doente também teve discussões a esse nível com os
colegas de trabalho quando estes não foram demasiado perfeitos nas suas tarefas
e com os vizinhos, quando o doente via algum lixo fora do caixote e algum carro
mal estacionado.
Em relação à
obsessão pelo ciúme, o doente tem algumas discussões com a esposa e filhos por
pensar que, quando estes alteram qualquer projecto, que devem estar a aprontar
qualquer coisa contra ele. Na relação laboral, o doente pensa que os colegas,
quando se esforçam no emprego, que estão a lutar para serem melhor que ele, e
com isso conquistarem uma promoção.
Início
das dificuldades
O doente sempre
foi uma pessoa perfeccionista devido às ideias incutidas pelos pais durante a
sua infância, descritas mais adiante.
Com o passar dos
anos, o doente foi manifestando cada vez mais perfeccionismo e pelo facto de
querer sempre a perfeição em tudo.
Desde os seus
dezoito anos de idade, o doente começou a manifestar sintomas de obsessão e
compulsão.Com dezoito anos de idade, o doente viveu um acontecimento que
alimentou a sua obsessão pelo perfeccionismo e pelo ciúme e traição. A obsessão
pelo perfeccionismo foi alimentada quando o doente teve um trabalho para
apresentar numa aula e quando o apresentou, o seu professor lhe disse que
deveria estar mais perfeito, pensando o doente que o trabalho estava excelente.
Desde então, o doente começou a buscar a perfeição em tudo o que ele fazia. As
obsessões pela traição e ciúme começaram também aos dezoito anos, quando o
doente tinha uma viagem de estudo marcada com os colegas e, sem qualquer motivo
eles lhe disseram que ele não podia ir. Quando ia à casa de banho, começou a
verificar se deixou a luz apagada e se ficou tudo perfeito. Com o passar dos
anos, o doente ficou dominado pelas obsessões e pelas compulsões. A sua
primeira compulsão foi de apagar a luz do interruptor da casa de banho 7 vezes
para ter a certeza de que a luz ficou devidamente apagada.
História
de desenvolvimento
A gravidez da
mãe do doente e o nascimento aconteceram de forma normal e desejada. O doente
foi uma criança que obteve um desenvolvimento normal para a idade. O
desenvolvimento psicológico e emocional, o doente relata que os pais exigiam
que ele fosse melhor do que as outras crianças em tudo.O desenvolvimento da
marcha, da fala e das restantes vertentes físicas correu de forma normal para a
idade.
O doente relata
que a sua infância foi normal, porém sempre ouvia os seus pais dizerem que ele
não era tão bom na escola e que queriam melhores resultados, por isso sempre
exigiam mais e melhor. O doente, na infância, teve sarampo, como doença mais
significativa.
A família do
doente organizava-se de forma austera. Os pais não discutiam mas sempre falavam
com o doente para não fazer asneiras, para não falar com estranhos e para ser
melhor do que os outros em tudo.
Durante a
infância a relação com os amigos e colegas de escola era uma relação de
desafio, pois o doente, devido às exigências dos seus pais, tinha que ser
melhor do que os amigos e colegas e por esse facto a relação com eles não era a
melhor,
Quando o doente
se portava mal ou quando não tinha notas máximas, os seus pais gritavam
repetidamente com o doente como forma de o castigar, dando sermões, dizendo que
ele tinha que ser o melhor em todas as disciplinas e ser um exemplo a seguir
pelos colegas da escola.
A relação com as
raparigas não era das melhores uma vez que o doente apresentava na sua mente
uma ideação perfeccionista em relação às raparigas, perfeição essa incutida
pelos pais, pois os pais incutiram no doente uma ideia de mulher perfeita que o
doente, mais tarde teria de conquistar, uma mulher que tivesse todos os
atributos de uma dama, que soubesse comportar-se de uma maneira fina e que
fosse bastante inteligente O doente não teve nenhuma namorada na infância e na
adolescência porque pensava que só iria casar com alguém que fosse uma dona de
casa exemplar, inteligente, afectuosa e meiga.
O paciente não
teve grandes momentos significativos de vida mas relata que o momento que o
marcou de uma forma signifiativa foi a educação exagerada incutida pelos pais,
que exigiam melhores resultados e que o doente fosse um exemplo a seguir pelos outros.
No ambiente
laboral, a relação com os colegas de trabalho é uma relação de competitividade,
visto que o doente sempre se apresenta como o principal candidato ao melhor
posto ou promoção.
O doente vê-se
como uma pessoa que quer ser a melhor de todas em todas as actividades. Vê-se
como a pessoa que é dona da razão mas gostaria de ser mais perfeito do que acha
que é.
O doente gosta
muito de andar de bicicleta, de ver televisão pois quando vê televisão critica
sempre algum apresentador pela forma de apresentar o programa ou pela forma de
se vestir.
O doente tem
como religião a religião católica.
Avaliação
O doente foi
sujeito à aplicação do “MOC – Maudsley Obsessive Compulsive Inventory” que
obteve um total de 126 no score total da frequência e de 168 no score total da
ansiedade. Estes resultados significam que o doente tem sintomatologia elevada
em relação à perturbação obsessivo – compulsiva.
Formulação
Clínica
Perante a
informação recolhida e tendo em conta os sintomas apresentados pelo doente,
parece-nos estar presente uma Perturbação Obsessivo-Compulsiva devido aos
pensamentos intrusivos que avassalam a mente do doente de forma repetitiva e
pela presença de compulsões ou rituais que o doente executa como forma de se
livrar das obsessões.
Diagnóstico Multiaxial
Eixo
I:
300.3 Perturbação Obsessivo – Compulsiva (F12.8)
Eixo
II:
V71.09 Sem diagnóstico (Z03.2).
Eixo
III:
Nenhum
Eixo
IV:
Nenhum
Eixo
V:
AGF = 65
O doente
apresenta sintomatologia obsessiva – compulsiva visto que tem compulsões que
são ritual que efectua de forma repetitiva como forma de se aliviar das
obsessões que invadem a sua mente. O doente apresenta obsessão pelo
perfeccionismo e pela ordem, pelo facto de querer ser sempre o melhor em todos
os campos. O doente apresenta também obsessão pela desconfiança da esposa e
filhos pois devido à sua obsessão teme que eles façam algo contra o doente mas
por outro lado teme que algo de mal aconteça a eles. No trabalho quer sempre
ser o melhor em tudo do que os colegas. Na relação com os vizinhos é obsessivo
pela perfeição pois o doente sempre discute com os vizinhos por colocarem o
lixo fora do caixote ou por terem estacionado o carro em cima do passeio.
Como forma de se
aliviar das obsessões o doente tem compulsões como verificar 7 vezes se tudo
está em ordem, arrumar as gavetas 7 vezes e vestir-se 7 vezes todos os dias
antes de ir para o trabalho. O doente acredita que ao efectuar as compulsões
tudo o que deseja acontecerá. O doente tem como hábitos os de verificar a ordem
dos objectos na sua casa e no seu emprego. Como forma de evitar o mal-estar
provocado pelas obsessões o doente quando caminha na rua nunca pisa as linhas
dos passeios. O doente teme ignorar ou suprimir os pensamentos intrusivos,
impulsos ou imagens com algum outro pensamentos ou acção.
Diagnóstico
Diferencial
A Perturbação
Obsessivo – Compulsiva distingue-se da Perturbação Paranóide da Personalidade e
da Perturbação de Tique.
A Perturbação
Obsessivo – Compulsiva distingue-se da perturbação paranóide da personalidade
na medida em que na perturbação paranóide o doente tem alterações do pensamento
constantes e na perturbação obsessivo – compulsiva a sintomatologia paranóide é
derivada às obsessões que invadem a mente do doente.
Distingue-se da
perturbação de Gilles de la Tourette na medida em que, em contraste com a
compulsão, os tiques e os movimentos estereotipados são tipicamente menos
complexos e não tem como objectivo neutralizar a obsessão.
Também se
distingue de perturbação da personalidade obsessivo-compulsiva na medida em
que, este doente apresenta perfeccionismo excessivo em relação a si próprio e
aos outros e uma devoção excessiva pelo trabalho, mas este doente não tem uma
perturbação de personalidade obsessivo-compulsiva pois no seu caso, o doente
apresenta compulsões, que no caso das perturbações da personalidade
obsessivo-compulsiva não aparecem.
Factores
Predisponentes
O doente ao
longo da sua infância teve uma educação rígida tendo por base valores de
exigência. Os pais do doente manifestavam sempre que o doente fosse exigente
consigo mesmo e queria que ele fosse o melhor em tudo e também para sempre
desconfiar das outras pessoas.
Estes valores de
exigência para consigo mesmo fizeram com que o doente pensasse cada vez mais em
ser o melhor do que os outros em tudo e então esses pensamentos fizeram com que
o doente ficasse com um pensamento cada vez mais exigente e desconfiado.
Factores
Precipitantes
Tudo começou
quando o doente tinha dezoito anos e tinha um trabalho para apresentar na
universidade, ele estava convencido de que o seu professor iria se orgulhar
pelo trabalho feito por ele, mas foi o contrário, o seu professor disse ao
doente que devia se esforçar mais. Outro factor foi quando o doente tinha uma
viagem de estudo com os colegas e sem qualquer motivo os seus colegas lhe
disseram que ele não podia ir a essa viagem de estudo. Desde esses
acontecimentos na vida do doente, o mesmo tem apresentado obsessão pelo
perfeccionismo e ordem e pela traição e ciúme.
Factores
de Manutenção
O doente
manifesta ao longo do tempo sintomas de obsessão e de compulsão, que por si só
não são favoráveis para que o doente tenha a noção de que os pensamentos intrusivos
são apenas realizações da sua mente.
O doente efectua
movimentos estereotipados porque acha que a esposa e os filhos não façam nada
contra ele, pois ele acredita que, ao efectuar tais movimentos, como vestir-se
7 vezes todos os dias, ninguém irá aprontar contra ele. O doente não tem noção
de que, se deixar de efectuar tais movimentos, os seus filhos e a esposa irão fazer
algo ou não contra ele. O doente tem como hábito acender e apagar os
interruptores da luz da sua casa como forma de reduzir a ansiedade causada
pelas obsessões.
Intervenção
Exposição
e prevenção de resposta:
Os princípios do
tratamento baseiam-se no modelo psicológico. Os procedimentos são os seguintes:
1. Exposição
deliberada às situações que provocam evitamento;
2. Exposição
directa aos estímulos receantes;
3. Prevenção
dos rituais compulsivos e comportamentos neutralizantes.
Como método de
intervenção terapêutica propõe-se utilizar os métodos da exposição com
prevenção de resposta e da distracção do pensamento.
O doente com
perturbação obsessivo-compulsiva apresenta obsessão pelo perfeccionismo e pelo
ciúme por parte da esposa. O doente verifica as gavetas 7 vezes todos os dias
porque acha que, cumprindo esse ritual, a esposa e os filhos não compirarão
contra ele. Neste problema tenta-se expor o doente impedindo-o de realizar o
ritual. O objectivo é fazer com que o doente chegue à conclusão de que as
consequências não acontecem.
Outra possível
técnica terapêutica que pode ser aplicada neste caso é a distracção do pensamento
que consiste em pedir ao doente que não pense no que lhe provoca mais ansiedade
mas o esforço do doente em não pensar naquilo que lhe traz mais ansiedade faz
com que pense mesmo naquilo que lhe causa ansiedade.
Conceptualização
do caso
A perturbação
obsessivo.compulsiva é uma perturbação que se insere no grupo das perturbações
da ansiedade e também no grupo das perturbações da personalidade, sendo, neste
caso pertencente ao grupo das perturbações da ansiedade.
Neste caso, o
doente insere-se no grupo da perturbação obsessivo-compulsiva que diz respeito
à verificação pelo facto de estar com obsessões acerca do mal que a esposa e os
filhos possam, eventualmente, fazer contra ele.
Nesta
perturbação é habitual ocorrerem rituais que o doente utiliza para neutralizar as
obsessões. Neste caso, o doente verifica 7 vezes as gavetas de forma a
neutralizar a obsessão sobre o que a esposa e os filhos possam, eventualmente,
fazer contra ele. Os rituais que o doente utiliza têm também o fim de diminuir
a ansiedade provocada pelas obsessões.
O que se passa
na mente do doente são distorções cognitivas que são provenientes do
perfeccionismo transmitido pela educação dada pelos pais, pois os pais do
doente sempre incutiram uma ideia de que o filho tinha que, forçosamente, ser
perfeito em tudo que fazia.
Modelo
psicológico da Perturbação Obsessivo-Compulsiva
De acordo com
este modelo explicativo, as características essenciais dos problemas obsessivos
são:
1) Evitamento
de objectos ou situações que provocam obsessões;
2) Obsessões;
3) Comportamentos
compulsivos e ritualizados.
De acordo com
este modelo:
1. As
obsessões são pensamentos que tem aparecido associadas à ansiedade
(Condicionada).
2. As
compulsões são comportamentos voluntários que terminam com a exposição dos
pensamentos e devem fornecer alívio para a ansiedade ou desconforto.
3. Os
doentes aprendem que os comportamentos evitativos podem prevenir os pensamentos
obsessivos (e ansiedade).
Os doentes recorrem ao evitamento das situações ou
objectos que provocam obsessões para fugir das mesmas.
Quando, apesar do evitamento, as obsessões ocorrem,
os rituais geralmente resultam. Estes são mais reconhecidos como comportamentos
com características obsessivas, particularmente quando eles são repetitivos e
associados a uma ansiedade temporária.
No caso acima
apresentado, o doente recorre aos rituais com o objectivo de neutralizar a
ansiedade causada pelos pensamentos obsessivos de que os filhos e a esposa
estariam a conspirar contra ele.
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